Ficar muitas horas sentado se tornou um dos principais problemas da vida moderna. Esse comportamento, comum na rotina de grande parte da população, está ligado ao modelo atual de trabalho e ao estilo de vida mais sedentário. No entanto, esse hábito está associado ao aumento do risco de mortalidade e a diversos impactos negativos para a saúde.
“O sedentarismo invisível refere-se a comportamentos de baixo gasto energético (como ficar sentado ou deitado por longos períodos), mesmo em indivíduos que praticam atividade física regular. Trabalhar sentado é um exemplo clássico, mas o conceito engloba qualquer situação em que há restrição de movimento contínuo, como dirigir por horas, uso excessivo de telas ou até ficar em pé, estático”, explica o ortopedista Dr. Fernando Jorge, especialista em Medicina Regenerativa, em Intervenção em Dor e em Medicina Intervencionista em Dor.
Dessa maneira, o sedentarismo pode atingir até quem pratica uma hora de atividade física por dia. “Segundo um estudo de 2023 do Journal of Behavioral Nutrition and Physical Activity, o sedentarismo invisível está associado a períodos prolongados sem contração muscular significativa, independentemente da prática esporádica de exercícios e até mesmo musculação”, acrescenta.
Impactos na circulação sanguínea
A falta de movimento afeta o funcionamento do corpo, especialmente a circulação sanguínea. “O problema é que esses momentos rotineiros de inatividade, como trabalhar sentado oito horas por dia (ou mais), aumenta em 10% o risco de morte, segundo estudo publicado na revista médica britânica The Lancet. Além disso, como a panturrilha é o coração das pernas, a cada contração muscular bombeamos o sangue e ativamos a nossa circulação”, explica a cirurgiã vascular Dra. Aline Lamaita, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular.
Conforme a médica, os impactos de ficar muito tempo sem movimentar as panturrilhas são variados. “Situações onde essa musculatura fica parada muito tempo podem causar uma retenção de líquido nas pernas, levando a inchaço, pernas pesadas, cansadas e aumentando a predisposição de desenvolver varizes e trombose venosa”, acrescenta.
Riscos de complicações metabólicas e musculoesqueléticas
Segundo a Dra. Aline Lamaita, embora muitas pessoas com a rotina de trabalho pesada não tenham tempo e disposição para realizar atividade física em outro horário, isso é necessário para que haja pelo menos um desenvolvimento da musculatura efetiva, que poderia de certa forma minimizar os efeitos deletérios do trabalho sentado.
Mas isso pode não ser suficiente. De acordo com o Dr. Fernando Jorge, indivíduos que cumprem as diretrizes de exercício (150 minutos/semanais de atividade moderada, conforme a Organização Mundial da Saúde – OMS), mas passam mais de 8 horas/dia sentados têm maior risco de complicações metabólicas e musculoesqueléticas.
“Uma meta-análise de 2024 do British Journal of Sports Medicine demonstrou que 30-40 minutos diários de exercício não neutralizam os danos de horas sentado, especialmente em termos de rigidez articular e risco cardiovascular”, explica.
Problemas de pressão e do metabolismo do açúcar também podem aparecer devido ao sedentarismo. “Sabemos que a pressão alta está associada a um maior risco de aparecimento de varizes, formação de trombos e incidência de aterosclerose, infarto e acidente vascular cerebral. Os níveis de açúcar descontrolados, por sua vez, também afetam a saúde arterial, o fluxo sanguíneo e podem impedir a passagem do sangue para o coração”, afirma a Dra. Aline Lamaita.
Outros riscos do sedentarismo invisível
O sedentarismo invisível, além dos problemas circulatórios e metabólicos, pode causar fraqueza muscular e desequilíbrios posturais, com músculos glúteos e do core enfraquecendo, o que aumenta a carga sobre a coluna lombar (risco de hérnia discal). “Além disso, pode ocorrer um encurtamento dos flexores de quadril (como iliopsoas), com risco de dor lombar e alterações na marcha”, explica o Dr. Fernando Jorge.
Além disso, conforme o médico, também há riscos de degeneração articular. “Isso ocorre pois há redução da produção de líquido sinovial em articulações imobilizadas (exemplo: joelhos e quadril), acelerando osteoartrose; e também há risco de rigidez da coluna cervical e síndrome do ombro congelado por postura cifótica ao usar computador”, destaca.
Outros problemas que podem surgir são as síndromes de sobrecarga, como tendinopatias (tendinite do manguito rotador, por exemplo) por movimentos repetitivos em postura inadequada, ou síndrome do piriforme (dor ciática) devido à compressão nervosa em quadris pouco mobilizados, destaca o ortopedista.

Reduzindo os impactos do sedentarismo invisível
Segundo a Dra. Aline Lamaita, o ideal é fazer ‘miniexercícios’, como ter apenas cinco minutos de caminhada a cada meia hora para contrabalancear os efeitos negativos de ficar muito tempo sentado. “É fundamental interromper o sedentarismo a cada 30-60 minutos, com microbreaks de 2 a 5 minutos (caminhar, alongar panturrilhas ou fazer agachamentos leves)”, diz o Dr. Fernando Jorge.
Hábitos simples podem ser bastante positivos. “De tempos em tempos, procure levantar-se da cadeira para caminhar um pouco, seja para ir ao banheiro, tomar um café, beber água ou respirar um ar fresco”, indica o médico.
Caso não seja possível se levantar, o Dr. Fernando Jorge explica que alguns exercícios podem ser feitos até mesmo sentado: “Comece levantando os calcanhares enquanto mantém as pontas dos pés no chão e permaneça nessa posição por alguns minutos. Depois, coloque os calcanhares no chão e levante os dedos dos pés. Segure por alguns segundos e repita o alongamento algumas vezes”, aconselha.
A Dra. Aline Lamaita indica mais uma opção: “Outro ótimo exercício consiste em traçar círculos com os pés por alguns segundos, mudando de direção de fora para dentro e de dentro para fora. Você também pode dobrar a perna e abraçar os joelhos o mais próximo possível do peito. Permaneça assim por alguns minutos, sempre trocando de perna”.
Adaptações importantes no local de trabalho
O Dr. Fernando Jorge ainda recomenda o uso de mesas com ajustes de altura e, se possível, alternar entre sentar e ficar em pé. “Outra estratégia é o reforço muscular preventivo, com exercícios de core (prancha, ponte glútea) e alongamento de cadeia posterior (alongamento de piriforme, músculo que está localizado na região do quadril, próximo à nádega). Fazer mobilidade torácica (rotações de tronco) pode ajudar a evitar cifose”, sugere.
Outras adaptações recomendadas pelo médico são: “Manter o monitor na altura dos olhos (evitar flexão cervical), ter apoio para pés e cadeira com suporte lombar e contar com dispositivos ativos (cadeira com bola suíça ou balance board para estimular microcontrações) também pode ajudar”.
Hábitos que fazem diferença
O ortopedista também sugere aumentar o que é chamado de NEAT (Non-Exercise Activity Thermogenesis), que tem relação com a energia gasta no dia a dia, sem contar com o sono, a alimentação ou a prática de exercícios físicos. “Por exemplo, optar por escadas, fazer reuniões caminhando ou tarefas domésticas leves”, indica o Dr. Fernando Jorge.
O cuidado com a hidratação e a alimentação também é importante. “Beber água também é fundamental, pois ela mantém a viscosidade do líquido sinovial. E, claro, é recomendável ter uma boa alimentação, incluindo alimentos anti-inflamatórios (ômega 3, cúrcuma) para saúde articular. A OMS recomenda que qualquer movimento conta – até levantar para pegar água já reduz a estase circulatória e a rigidez muscular. Integrar hábitos simples pode mitigar significativamente os riscos do sedentarismo invisível”, finaliza o Dr. Fernando Jorge.
Por Maria Claudia Amoroso
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