O relato de uma são-bentense serviu de base para um documentário sobre violência doméstica produzido pelo canal do renomado médico Drauzio Varella. Lançado em novembro do ano passado, o curta foi gravado em São Bento do Sul e conversou com uma moradora vítima de violência doméstica que, após conhecer um canal de denúncias do Magazine Luiza, procurou as autoridades e colocou fim em um relacionamento abusivo de mais de 10 anos. O documentário possui pouco mais de 30 minutos e está disponível no Portal Drauzio Varella.
Chamado de “Pra quem eu vou contar?”, o documentário traz a história de Bárbara, nome fictício atribuído à são-bentense para preservar sua real identidade. Ela conta que as agressões começaram esporadicamente, ocorrendo uma vez ao ano. “Parece que ele ia guardando, aí depois era por qualquer coisa. Por ciúme, por uma mentira que ele contava e eu descobria. Para as pessoas ele era muito bom e, se eu falasse, ninguém acreditaria”, conta ela.
Aquele era o primeiro relacionamento de Bárbara. Ela conheceu o ex-companheiro quando tinha de 15 para 16 anos e começou a namorar. “Quando eu tinha 17 anos ele já foi morar comigo e com minha mãe. A gente fazia uns bicos durante a noite e, de dia, ficava em casa. Quando eu estava grávida do meu primeiro filho, ele saiu de casa e ficou o final de semana todo fora de casa. Aquilo me deu um alerta”, lembra.
Os casos de violência se tornaram mais constantes no fim do relacionamento. Os primeiros sinais, segundo Bárbara, começaram antes, mas, na época, era difícil saber como tudo iria terminar. “Ele tinha uns picos. No final de semana bebia muito e se transformava, durante a semana passava tranquilo. Quando meu filho tinha seis anos e minha filha cinco, a gente teve uma briga bem feia depois que descobri outra traição dele. Eu estava passando pano na cozinha, ele me pegou pelos cabelos, me jogou no chão, me deu vários chutes e me deixou cheia de hematomas”, contou.
Após as agressões, o ex-companheiro agia como se nada tivesse acontecido, enquanto a vítima se sentia culpada por aquilo e com vergonha, sem forças para contar para alguém o que acontecia dentro de casa. “A gente se sente propriedade da pessoa, como se ela fosse sua dona. Era como se eu fosse um produto dele”, desabafou.
Denúncia e prisão
Quando ouviu falar sobre o Canal da Mulher, do Magazine Luiza, Bárbara estudou sobre o canal de denúncia e viu que tudo se encaixava com o que estava sofrendo. A situação se agravou na noite do dia 31 de dezembro de 2019, quando ela sofreu novos abusos do então companheiro e decidiu dar um basta naquilo. No dia seguinte, por volta das 6h30, procurou atendimento no canal e desabafou sobre os quase 10 anos de relacionamento abusivo que vivia. “As meninas foram muito rápidas, acionaram uma psicóloga e no mesmo dia me ligaram para entender o que acontecia. Aí consegui abrir meu coração pela primeira vez e pedir ajuda”, citou ela.
Naquela semana, após novas agressões, ela conta que fez uma maquiagem e foi trabalhar. Porém, no trabalho, seus colegas perceberam a situação e acionaram o gerente, que perguntou o que estava acontecendo, orientando-a a ficar fora de casa naquela noite e separar as coisas do então marido. Ela mandou uma mensagem para ele dizendo que ia sair de casa e só voltaria quando ele tivesse saído da residência. Porém, o agressor surtou e realizou mais de 200 ligações para ela, ameaçando-a de morte e de invadir seu local de trabalho.
Quando Bárbara viu seu celular no armário da empresa, notou uma mensagem dele dizendo que estava indo ao seu local de trabalho para matá-la. Ao fechar a porta do armário, viu sua gestora informando que seu ex estava lá. Bárbara ficou trancada no estoque da empresa até que a polícia chegasse ao local e levasse o agressor.
O homem prestou depoimento e foi solto no dia seguinte por não haver flagrante, porém com uma medida protetiva. “Levei as crianças pra escola e fui trabalhar. Quando cheguei lá, me dispensaram para descansar. Voltei pra casa antes do meio-dia e ele apareceu na minha porta como se nada tivesse acontecido. Quando ele entrou no quarto, eu saí correndo descalça, entrei no carro e fui direto na delegacia”, conta ela.
Quando a polícia chegou à residência, ele estava deitado no sofá e assistindo TV, sem camisa. “Levaram ele algemado e ele ficou dois anos e meio preso. Depois disso, nunca mais tive contato com ele”, relatou Bárbara. O agressor foi preso em fevereiro de 2020 e solto no segundo semestre de 2022.
Como denunciar
Conforme o delegado Valdir Xavier, titular da Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso (DPCAMI), se a denúncia for anônima, o primeiro passo feito pela Polícia Civil é informar o Setor de Investigação Criminal. Os policiais desse setor são os responsáveis por se deslocarem até o endereço para esclarecer os fatos, identificar os envolvidos, saber sobre a veracidade e arrolar as testemunhas. “Se a denúncia partiu da própria vítima, vai depender da natureza da ocorrência. Em todos os casos, ela já fica orientada sobre as medidas protetivas e a necessidade de realizar o exame de corpo de delito”, explica Xavier.
Havendo elementos suficientes para se instaurar um procedimento, geralmente um inquérito policial, passa-se à oitiva das demais pessoas envolvidas, como testemunhas e investigado, e à juntada de laudos periciais. “Ao final, se produz um relatório com ou sem indiciamento, isto é, havendo indícios de que o investigado praticou o crime, ele é indiciado”, frisa Valdir.
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Para assistir ao documentário acesse pelo link abre.ai/lNst
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