Imagine estar num ambiente com a luz apagada. Agora você precisa caminhar pelo local. Acrescente obstáculos, como buracos, degraus e até mesmo paredes ásperas. Também existem movimento, pessoas esbarrando em você e carros passando a poucos metros de distância. Apesar de agora estarmos falando no campo da imaginação, para algumas pessoas isso é a realidade, como para Gilberto Gilmar Vaz.
O são-bentense é deficiente visual, porém, o fato de não conseguir enxergar foi superado. Ele circula sozinho pelas ruas do munícipio há mais de 10 anos. No começo, teve quedas, machucados, chegou a ser atropelado, mas hoje nada impede a sua saída de casa. “No começo tinha vergonha, imaginava as pessoas me olhando, algumas falavam que estava fingindo ser cego, mas precisa ter coragem, se ficar em casa, vai ficar deprimido e já dependi da minha mãe por anos”, conta.
Muitos se questionam como ele consegue, mas é a memorização. Ele ainda lembra dos lugares antes de ter perdido a visão. “Eu conheço a cidade, nasci aqui, é como um mapa, então esse mapa a gente tem na cabeça, a localização dos bairros, então sei onde tenho que ir, tenho tudo na cabeça. Você pode fazer um teste dentro da sua cabeça, você fecha seus olhos, vai da sala para cozinha, e depois vai sentindo como é”, destaca.
Além disso, após perder a visão, sua audição ficou mais apurada, o que ajuda na hora de prestar atenção, como no momento de atravessar a rua. “Vou me guiando com a mão, fui aprendendo, perdi o medo e depois me acostumei”, menciona.
Gilberto sempre bate no orelhão instalado na Rua Henrique Schwarz
Um lugar para todos
Apesar da sua valentia, os desafios diários continuam. E existe uma palavra, que apesar de ser bem comum, muitos não sabem o real significado: acessibilidade. Muitas vezes, temos a ideia equivocada de que o termo está associada somente a rampas de acesso ou vagas de estacionamento para pessoas com deficiência. Na verdade, o conceito vai muito além. Gilberto fala diretamente sobre o direito de ir e vir, sempre com segurança, conforto e eficiência e, principalmente, autonomia.
Mas isso ainda não é uma realidade em São Bento do Sul. A falta de acessibilidade está presente em todos os cantos, seja nos transportes públicos, nos prédios e espaços públicos, hotéis e até mesmo em restaurantes. É claro, a cidade foi construída numa época que o “planejamento urbano” não era algo tão discutido entre a população. Até mesmo Gilberto garante que o munícipio melhorou, mas ainda tem muito trabalho para fazer. Na área central, os principais problemas são as calçadas. Sempre haverá obstáculos, como vasos de flores em frente a comércios e até mesmo os antigos orelhões (telefones públicos) ainda ocupam espaço nas vias públicas. “Sempre bato a cabeça”, lamenta.
Já os pisos táteis que já foram instalados anos atrás, dentro das normas federais, hoje não ajudam. Segundo Gilberto, estão desgastados, precisam ser trocados para ajudar a guiar as pessoas com deficiência visual. “Tem lugares que está muito baixo, eles deveriam levantar eles um pouquinho, porque não dá para sentir com o guia”, explica.
Ainda há muito o que melhorar na região, e são em passos lentos que, ao decorrer dos anos, as obras realizadas pela Prefeitura – assim como as futuras construções como a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e a reforma do ginásio Annes Gualberto – já serão totalmente acessíveis, conforme o que estipula normas de acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). “E tudo isso leva um tempo, infelizmente a gente não consegue ter uma velocidade nas ações do jeito que todo mundo espera, então é uma coisa crescente, vejo que estamos evoluindo e nisso que precisamos se manter, evoluir nessas questões e buscar atender cada vez mais para se adaptar”, conta o secretário de Planejamento e Urbanismo, Bruno Seefeld.
Até mesmo o próprio Plano Diretor delimita diversos prazos a serem cumpridos na questão de tornar uma cidade acessível para todos os públicos, desde deficientes visuais, cadeirantes e idosos. A expectativa é que no futuro todos os moradores consigam circular livremente, sem depender de guias e obstáculos pelo caminho.
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