Há quem tente evitar qualquer traço de monotonia, como se ficar sem fazer nada fosse um problema a ser eliminado. Mas o tédio pode ser, na verdade, um convite à escuta interior. Em um mundo que corre, parar pode ser mais transformador do que seguir no automático.
Para o especialista André Leão, mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) e estudioso dos mecanismos cerebrais da dor e do comportamento, o tédio pode ser uma espécie de antídoto moderno, especialmente em um mundo hiperconectado, acelerado e repleto de distrações.
“Vivemos uma cultura da produtividade a qualquer custo, em que todo silêncio é visto como desperdício de tempo. Mas o cérebro precisa dessas pausas para se reorganizar, criar, refletir e até se proteger do estresse”, afirma.
Ignorado por muitos, o tédio oferece uma oportunidade rara: reorganizar pensamentos, perceber emoções sutis e sair do piloto automático. Em vez de fuga, pode representar reconexão. Veja 7 vezes em que ele faz bem!
1. Quando o cérebro precisa recalibrar
Segundo André Leão, o tédio funciona como uma pausa natural entre dois estímulos intensos. “Ele permite que o cérebro ative a chamada Default Mode Network, uma rede que entra em ação quando não estamos focados em nada específico, mas que favorece a reorganização interna”, explica. É nesse estado que memórias se consolidam, emoções são processadas e ideias ganham forma.
2. Quando queremos ser mais criativos
Sabe aquele momento em que você se pega olhando para o teto e, de repente, surge uma ideia brilhante? Isso não é acaso. “A criatividade precisa de silêncio, de espaço mental. É no tédio que o cérebro conecta memórias e experiências de forma não linear, gerando soluções inesperadas”, diz o especialista.
3. Quando estamos sobrecarregados emocionalmente
O tédio pode ser um convite ao autoconhecimento. Ao se desconectar dos estímulos externos, ganhamos espaço para olhar para dentro e identificar emoções, padrões de comportamento e desejos que passam despercebidos na correria. “É como uma escuta interna, uma pausa restauradora que ajuda a regular o sistema nervoso”, afirma André Leão.

4. Quando crianças e adolescentes precisam aprender a criar
Na infância, o tédio é essencial para o desenvolvimento da criatividade e da autorregulação. “Infelizmente, muitas crianças hoje vivem agendas cheias e têm pouco espaço para o ócio. Isso compromete o amadurecimento da imaginação e da autonomia emocional”, alerta o especialista. Deixar os pequenos se entediarem, com segurança, é dar a eles a chance de inventar e descobrir quem são.
5. Quando buscamos mais tolerância à frustração
Em um mundo onde tudo é imediato, o tédio nos ensina a esperar. “Ele nos treina para lidar com a ausência de recompensa instantânea, o que é fundamental para o amadurecimento emocional e cognitivo”, diz André Leão. Ignorar isso pode levar à impulsividade, à baixa resiliência e até a sintomas de ansiedade.
6. Quando a rotina está acelerada demais
Para quem vive em modo multitarefa, agendar momentos de ócio pode ser um ato de autocuidado. “Caminhar sem celular, comer sem telas, observar o ambiente em silêncio: tudo isso desacelera o cérebro e permite uma pausa restauradora”, orienta. E não, isso não é perda de tempo. É uma forma de manter a mente saudável.
7. Quando queremos evitar o esgotamento mental
O tédio bem-vivido pode prevenir o burnout. “Ao conviver com o vazio, damos ao cérebro uma chance de repousar em outro nível. Isso regula o humor, melhora o sono e reduz o estresse crônico”, afirma o especialista. Em vez de resistir ao tédio, a proposta é abraçá-lo com consciência.
Cuidado com o tédio
Apesar de seus benefícios, o tédio também pode sinalizar problemas. “Se ele vem acompanhado de apatia, perda de sentido ou tristeza constante, pode indicar um quadro depressivo ou desequilíbrio emocional”, alerta André Leão. Nesses casos, o ideal é procurar ajuda especializada.
Tédio não é preguiça. Nem falta de estímulo. É, muitas vezes, uma forma de reconexão interna, um momento de escuta silenciosa que pode abrir espaço para criatividade, cura emocional e equilíbrio. Em vez de fugir do tédio, que tal dar a ele uma chance?
Por Sarah Monteiro
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